Para onde vais?

Procurai, procurais. Estais num cachorro sem mato, meu boi morreu, cadê o mato? Cadê o cachorro? Nem espeto de pau no gato, todos querem puxar meu saquinho pra sua brasa, cadê a água? Mais vale uma mão, chicotinho tá queimando, quem vê cara não vê coroa, em terra de cego é pior, duzentos milhões em ações, ai bota aqui, ai tira ali o teu, no meio da pedra tinha um caminho, jacaré de piranha, antes já era tarde, agora é que nunca, o que não mata esfola, homem que não homem, chora, quando tu vais indo, onde a vaca vai? Canja de galinha não tem no cardápio, onde está o cardápio? The cat comeu tua língua? Mané é malandro, malandro é mané. O mais realista está nu.

Mas em meio a isto há os que vêem as coisas de modo simples, resolvido, determinado, firme - branco no preto, azul e vermelho, rico e pobre, bom e mau, direita e sinistra - já olharam as fotos apresentadas e sabem quem é o mocinho e quem é o bandido, entram no ônibus lotado e têm janela (as janelas são numeradas, meus caros) reclamam do ar condicionado, que a plebe ignara não sabe fazer funcionar direito - oh, os tristes defeitos da plebe rude, que só entende uma linguagem - ripa nela! Gente mal nascida!

Um preto foi pego roubando - preto é preto e pronto! Um pobre foi pego roubando - pobre é isso aí! Um petista foi pego roubando - essa raça só matando! Oh, como somos espirituosos, oh, como somos bem, oh, como somos in, oh, como somos felizes, pois voltaremos a mandar no que sempre foi nosso por direito divino, ou seja, tudo, e será ainda melhor, pois agora os que antes sentiam apenas aquele ímpeto sexual passivo, agora nos amam e estão ansiosos por demonstrar. Querem que façamos o que nunca fizemos - teremos que inventar alguma perversão nova, off course, pois já lhes havíamos submetido a tudo. Ah, como são ridículos!

Os ladrõezinhos de galinha, quiseram nos comprar com coxinhas e asas afanadas do galinheiro. Não sabem que roubar de verdade é passar todo o galinheiro para o nome de um amigo. Que falta de classe! O que esperar? Quem não cursou a Sorbonne nunca será honoris causa. ``Os fins justificam os meios`` - é de rir! Os meios sempre justificaram-se por inteiro e por isto é que sempre tivemos os meios - uns e outros, e por isto sempre tivemos tudo por inteiro. O que sobra são os restos para a escória - a sujeira da boa raça, que decanta na base da pirâmide. É por isto que, bem nascidos, somos desde o princípio, temos todos os meios, vamos até o fim, que nunca justificou-nos nada, pois não é para nós o fim, mas para os outros - para nós há finesse, perene, eterna, sentamo-nos sempre à direita e temos, por direito hereditário, todo o tempo.

Oh, escravos, como é que não reconheceis vosso lugar, sem terdes de apanhar tanto? Há sim em vós vocação, excitação e lubricidade pela chibata. Pedis com vossos lombos à mostra que vos vergastemos. Pois não vos será negado! Nada vos é mais orgiástico que nossa fala suave e erudita entremeada ao som das chicotadas ardentes em vossas costas. Correi às urnas, implorai por nós, cachorrada sem mato. Nós vos daremos o mato, a ração, o norte, e invés de vulgares cachorros os faremos atilados cães de caça. Vinde, vinde, segui o estalo dos cabos nas nossas botas, guiai-vos por nossas cornetas. Aprestai-vos, pois logo soltaremos a raposa e aqueles dentre vós que primeiro a cercarem ficarão acomodados em nosso canil particular.