Eu também incendiaria um container novinho em folha!

Se esse container impedisse meu acesso ao alimento e à sobrevivência, minha ou de minha família. E isto possivelmente está acontecendo em Porto Alegre a várias pessoas. Os invisíveis e inaudíveis miseráveis não foram achados, e nem procurados, para opinar sobre essa sensacional inovação na cidade. Sensacional para mim, que sou classe média e tinha como um dos transtornos diários ter que lembrar e estar disponível para tirar o lixo na hora certa.

Mas e para os caras que passam revirando as sacolas entre a hora certa e a incerta? Os caras aqueles que a gente faz de conta que não vê e não ouve, porque vê-los lembra-nos que os pés de nossa prosperidade são de barro, que embora a tenhamos conquistado adquirindo direitos e privilégios, ali está uma prova de que há algo podre no esquema que o caminhão do lixo não pode levar embora, que um tanto dessa coisa podre continuará fedendo dentro de casa. Vemos que há algo injusto e cruel no processo e sentimos vergonha por nossa omissão e pela situação daqueles degradados, como porcos e vira latas abandonados, bem ali na nossa frente. Por isto olhamos para o outro lado.

Mas acho que não são esses que estão destruindo os containeres. Até pensei isto a princípio, mas olhando um pouco mais, vejo que eles não têm essa força e determinação para a luta ativa na resistência contra uma injustiça dos bacanas. Sua resistência é passiva e definhante, infelizmente.

É possível também que os incendiários sejam lixeiros demitidos por causa do desemprego gerado pelo novo sistema, o que viria a ser o mesmo problema: sobrevivência. Mas também não acho que seja o caso, pois estes trabalhadores estão inseridos no comprometimento social obediente e há o seguro desemprego, a esperança de novo emprego...

Talvez sejam pessoas ligadas às empresas que prestavam o serviço e agora que deixaram de fazê-lo perdem dinheiro. Talvez seja quem não gostou do container em frente à sua casa, loja ou vaga no estacionamento. Talvez seja um modo perverso de diversão, o vandalismo aleatório.

De todas essas hipóteses, aquela a que deveríamos dedicar mais cuidado e muita atenção para que não venha a se confirmar é a primeira. A presidenta Dilma disse que o Estado deverá correr atrás dos miseráveis, desta vez para protegê-los, e que conta com os prefeitos para isto e que os ajudará a fazê-lo.

Corre, Fortunati, antes que a iniciativa privada chegue primeiro e comece a te livrar definitivamente do serviço. Deste que não gostas e daquele que mais queres.

Comentários

Unknown disse…
Paz e bem!

Um detalhe menor e suplementar,
mas que merece registro:
Cadeirantes estão proibidos
de produzir lixo
;
pois não conseguem colocá-lo
dentro dos conteiners.
O princípio mais importante da Constituição Federal é o da dignidade humana. Não é digno para um ser humano retirar o lixo orgânico de um saco plástico, na calçada para seu próprio sustento ou alimentação. Isso não é digno. Felizmente, na cidade de Porto Alegre são pouquíssimas as pessoas que fazem isso. Compete ao estado dar a essas pessoas dignidade, mas muitas delas -- não querem o auxílio do estado -- preferem andar de calçada em calçada a procurar restos de comida. Assim como algumas delas preferem dormir na rua ao invés de dormir em albergues públicos, muitos dos quais tem pouca ocupação. O que também tem de ser aplaudido é essa nova postura da prefeitura de aplicar novas medidas em Porto Alegre, como ocorre no primeiro mundo. Infelizmente, temos no RS uma diminuta população de quarto mundo. E tem gente que os aplaude. Tenham a santa paciência.