Vinde pra lá... Vinde!

Para minhas filhotas,
para o Roberto Cataldo, que encerra garbosamente o primeiro tempo, com saldo de gols, em jogo em que o empate já o classifica, 
e para Olívio Dutra, que hoje completa 69 anos e continua nos inspirando com seu trabalho e modo de ser exemplares, como líder e cidadão.

No feriado de Corpus Christi
estava caminhando ali pela Usina do Gasômetro
e me veio correndo um poeminha.
Cabelinho crespo, rosto luminoso,
não tinha mais que meio metro de altura,
e me pedia, puxando na perna da calça:
- Tio, tio, me escreve!
Olhei com aborrecimento, pena
e um tantinho de fascínio relutante
para o bichinho que insistia:
- Tio, me escreve, tio!

- Agora não, respondi, estou sem caneta...
E nem papel eu tenho.

- Tio, então me grava aí no celular.

Ah, chateação! Que trabalheira, pensei.
- Não dá, tá sem bateria, menti.

- Ah, tio, me decora, então;
ninguém me declamou ainda;
ninguém disse nem o meu nome.

- Tá bom, mas daqui a pouco, tá?!
Vai ali na beira do rio olhar os barcos,
as borboletas, os passarinhos,
essas coisas que os poeminhas gostam,
vai.

Nisto encontrei uns conhecidos, e comecei a conversar sobre política, negócios...
E esqueci do poeminha.

Terminada a conversa lembrei dele, olhei em volta e notei a ausência. Estranho: o que era incômodo começou a fazer falta, e o sentimento de pena virou contra mim e parou a me doer.

Procurei o mandinho por todo o pátio, estacionamento, beira do rio, nos barcos, na volta dos passarinhos, as borboletas, que nem tinha, perto dos cachorros, mesmo com coleiras, entre as crianças, se segurava a mão de alguém, as barras das saias, as pernas das calças - nada!

Sumiu o poeminha.
E nem o seu nome eu sei.

Comentários

toniandre disse…
Beleza ... não perdeu a viagem! A perda de um poema gerou outro! Bem legal!
Adorei o poema!
Tomei a liberdade de republicá-lo no meu blog, com os devidos créditos.
Parabéns!
Abraços!
Jean Scharlau disse…
Obrigado, André. E Duhanne, que me disse o mesmo por e-mail. Foi bem assim mesmo. Cheguei culpado em casa por não ter dado a merecida atenção àquele poeminha, daí veio este outro e eu pude me redimir. Acho que funcionou e que podemos fazer assim também com outros erros que cometemos: na impossibilidade de conserto, providenciemos novo acerto.
Jean Scharlau disse…
Obrigado, Itárcio. Para festejar tua manifestação, chamo um sanfoneiro aí do teu contochão: http://www.youtube.com/watch?v=_qKmcT6QctQ
Abraço!