Aborto ? Resposta ao Tarso Temporão

Governo de esquerda-que-esquerda?! também tem suas frases para a platéia, cheias de efeito e vazias de sentido, assim como as que os neo liberais (aqueles outros, menos neo e mais liberais) apresentam: “um novo jeito de governar”, “o que tá bom fica, o que tá ruim muda” e outras. A mais recente frase, agora da esquerda-que-esquerda?! é: “o aborto é uma questão de saúde pública”. Ora, digam-me o que NÃO É questão de saúde pública. Que eu saiba, desnutrição, falta de saneamento, falta de escolas, alcoolismo, tabagismo, tráfico, jogatina, direção perigosa, desemprego, juros altos, insegurança no trabalho, má distribuição de renda, servidores relapsos, corruptos, coniventes, estradas inseguras, balas perdidas, facadas, pauladas, atropelamentos, acidentes, mordida de cobra, SUS que não paga os hospitais, falta de atendimento dentário, balas endereçadas, a banalização da vida e da morte, tudo isto são questões de saúde pública. Algumas configuram crimes, como aborto provocado, facada, dirigir bêbado, e outras não, como juiz ladrão que entra em licença médica remunerada (sem estar doente).

A questão então não é se o aborto é caso de saúde pública, pois disso não há a menor dúvida – o aborto obviamente é uma questão de saúde pública. O que está em discussão não é isto, mas se o aborto deve ou não ser liberado, descriminalizado, portanto despenalizado e custeado pelo Estado e em que período e circunstâncias.

Para que alguém não venha dizer que me escamoteio da discussão proposta, pego-a então sob esse prisma da saúde pública. Não podem ser consideradas nas estatísticas somente as mulheres que fazem aborto clandestino, é preciso considerar também as que deixam de fazê-lo porque é ilegal e desestimulado socialmente. É preciso considerar todos os bebês que vieram a nascer porque, em função da ilegalidade, não foram abortados. É preciso considerar os bebês que morrem abortados e o número muito maior que virá a morrer caso seja o aborto uma prática avalizada pelo Estado e por ele custeada. E não me venham falar em psicólogos e assistentes sociais à disposição da gestante para que ela decida bem subsidiada se quer mesmo ou não matar o bebê, num país onde hospitais pelo SUS não oferecem sequer leito para quem aguarda cirurgia de emergência e a própria cirurgia periga demorar mais que a morte.

Muitos consideram as pessoas um rebanho de números, onde 2+1=3 e 3-1=2. Eu acho que não, que não devemos considerar-nos assim, pois é esta maneira de pensar, de nos perceber, que nos perde, que nos mata, ainda em vida e mesmo que nos resguardemos entre os números que em tese não deveriam ser eliminados. A partir do momento em que nos encararmos apenas como numerais biológicos estaremos perdidos, como os rebanhos criados e engordados para abate e consumo, como os Iraquianos na frente dos fuzis dos Estados Unidos.

Matar bebês não deve ser aceito como método de controle de natalidade, assim como a guerra não deve ser método de controle populacional, e não é a tiros que se deve disputar a posse. O Estado não deve jamais avalizar e praticar nenhum desses métodos, a não ser em legítima defesa da vida, jamais em ataque a ela. Discutamos então as penas para a mulher, e para o homem, genitores, que abortam – trabalho e estudo comunitário em vez de prisão, por exemplo. Neste país onde a vida tem tido seu valor tão instável e depreciado, não pode o Estado tomar a iniciativa de desvalorizá-la, permitindo e avalizando a sua eliminação. Liberemos antes o furto sem agressão ou ameaça, vamos lá: aposentadoria precoce para os larápios não violentos, como o judiciário gentilmente faz com os seus, instituamos prêmios para falcatruas criativas e sem agressão que não tirem mais de 10% do incauto, como fazem alguns honrados pastores que não extrapolam. Acharam demais, né? Tá bem, descriminalizemos então só as crianças e a pobreza. Ah, descriminalizemos também a PQP. Mas quem faz aborto não.

PS - Tem muita gente que racionaliza sobre isso, para evitar a culpa, já que fez aborto, então começa a argumentar para si mesmo e para os outros que aborto é certo.

Comentários

Não foi demais não.Devemos abortar é a hipocrisia!!!!!

abçs
iagê disse…
Jean, acho o debate saudável, pra entrar desde logo nos termos da saúde pública. Respeito tua posição e penso que só assim - democraticamente debatendo - que poderemos definir os rumos pra essa questão. Por isso não servem os dogmas desse Papa e dessa Igreja. E por isso, também, a importância de espaços como os blogs.

Voltando à saúde: concordas que, sim, é um problema de saúde pública (como muitos outros que enumeraste), e dizes que "Não podem ser consideradas nas estatísticas somente as mulheres que fazem aborto clandestino, é preciso considerar também as que deixam de fazê-lo porque é ilegal e desestimulado socialmente. É preciso considerar todos os bebês que vieram a nascer porque, em função da ilegalidade, não foram abortados."

Exclusivamente sob essa perspectiva - da saúde pública - gostaria de levantar um ponto em defesa da descriminalização do aborto. Muitas mulheres morrem em decorrência de intervenções abortivas bizarras. Agora pergunto: que mulheres são essas? A maioria ou a minoria dentre as (muitas, não podemos ignorar a realidade) que fazem aborto? O aborto, na perspectiva que estamos discutindo, é um problema de saúde pública. E como é a saúde pública no Brasil? Quem tem acesso à saúde? Uma minoria ou uma maioria? Na minha opinião, quem tem acesso é a minoria - a mesma minoria que não morre ao abortar. E por quê? Porque são mulheres que - mais uma vez não ignorando a realidade - têm recursos para procurar uma das (muitas) clínicas top de linha de Porto Alegre, São Paulo, Curitiba, Rio de Janeiro...

Por isso, discordando do que tu colocas logo na primeira frase do post, não acho que seja uma "frase para platéia". Considerar um problema de saúde pública, sob a perspectiva da saúde PÚBLICA, é, sim, uma concepção de esquerda. É não ignorar que o aborto existe (e em grande escala no Brasil); que muitas mulheres morrem em decorrência dessa prática; que essas mortes ocorrem, na maioria absoluta dos casos (já que é uma intervenção tecnicamente simples, se as condições para tanto estiverem presentes), para as mulheres que não tem acesso à saúde; que essas mulheres não têm acesso à saúde porque fazem parte da mesma pobreza que, como tu mesmo disseste, temos que descriminalizar. Sob a perspectiva da saúde pública, legalizar o aborto não é fazer controle de natalidade, mas não dar as costas às desigualdades brasileiras, que semprem ficam evidenciam na falta de acesso aos direitos fundamentais: moradia, comida, SAÚDE, etc. A legalização - exclusivamente sob essa perspectiva - é o reconhecimento de que algumas mulheres (a maioria) têm o direito de não morrer em uma mesa de cirurgia fazendo aquilo que sempre se fez no Brasil, que sempre se fará, mas que só quem tem dinheiro pode sair ileso. Um tanto injusto, não? A criminalização (e tendo a pensar que isso se estende a TODAS as condutas tipificadas no nosso Código Penal - que é de 1941...) nunca preveniu qualquer conduta.
A legalização do aborto é questão de saúde pública e por isso necessária, mas não é, por óbvio, suficiente. Outras políticas públicas de saúde devem ser tomadas: educação sexual (eita expressão ruim, essa) e planejamento familiar (isso rende um debate em separado), por exemplo.

Quero dizer, com isso, que manter o aborto como crime (como um assassinato) não altera os fatos: o Brasil continuará abortando e as mulheres com dinheiro voltam pra casa no mesmo dia e repousam até o dia seguinte. Àquelas que não tem como pagar uma clínica nós já sabemos o destino reservado.

Um abraço
Aline Leão disse…
Iagê, meu querido, falou bonito sobre a questão da saúde pública. Já debati com o Jean sobre esse mesmo tema no meu blog e respeito a opinião dele. Um aborto jamais deve ser visto, e não sei porque Jean, tu insiste nisso, como um método contraceptivo. Ou tu acha que é mais fácil se submeter a um aborto do que usar algum anticoncepcional? Espero que nenhum homem pense que o aborto é uma decisão fácil ou um procedimento fácil. Continuo defendendo o aborto, não porque já por um momento na minha vida passei por isso. Passei e não quero passar por isso novamente. Mas acho q a mulher tem q ter esse direito e agora vou usar as palavras da minha amiga Marieta, pois faz parte de uma luta de libertação da mulher, histórica, não só da família patriarcal como também do Estado. A qualidade da vida dessa criança que ia nascer também estaria em jogo. Mas reafirmo, é uma decisão conjunta, de pai e mãe. Agora, esse pai que quiser assumir vai ter que estar presente na hora da fralda e de lavar as roupas também. Tem que estar preparada financeiramente e psicologicamente para ter um filho. Abraço.
Roy Frenkiel disse…
Jean, escrevi sobre isso ao Serjao (no meu blogue) e agora escrevo a ti). Isso ja foi discutido e ainda eh por pessoas mais capazes do que nos. Digo capazes, porque claramente voce segue uma logica e eu outra, por exemplo, mas nenhuma das duas eh completa. Meus argumentos sao muitos, mas devo lhe dizer que nao vejo motivo para argumentar. Voce chegou a oferecer medidas punitivas a mulheres (e seus maridos) que praticam o aborto, algo que eu nunca, nunca, nunca ouvi falar e que acho um tremendo absurdo, desses que eu jamais esperaria de voce, Jean. Mesmo. Por que absurdo? Um porque voce nunca precisou decidir se abortava algo ou nao, entao qual ideia pratica, imediata, voce tem do assunto? Como voce pode pedir que o estado gaste em punicao, mas nao eh emendas? Todos esses problemas ai que voce trouxe sao importantes e voce tem culpa sim de eles existirem, como tem os seus vizinhos, camarada, isso eh sociedade, assumir responsabilidade ao inves de passar pra frente e pro governo. Se o SUS tem problemas, primeiro temos de arrumar o SUS. Se a educacao eh problematica, o que foi feito ate agora para que ela seja reformada, votar no Lula? Voce tem compaixao de criancas, da pobreza, por que? Por que eu preciso me importar com isso e nao com o aborto? Melhor dizendo, onde esta sua logica para que o aborto seja menos importante do que esses criterios? Outra, de onde voce tirou que aborto eh matar criancas, de onde voce anuncia algo como fosse fato (pra voce), e voce sabe, muito bem sabido que nao eh (pra voce) um fato. Por que? Essas sao as minhas perguntas, esqueca o aborto, falo do Jean Scharlau, que so assim debates podem ser conduzidos com sinceridade. Nao entendo esse posicionamento.

abrax

RF
Nós Vimos: O Segredo de Beethoven

Por Carlos Dunham — Segunda, 18 de dezembro de 2006


Beethoven sem segredos

Você diria para uma mulher pobre, tuberculosa, grávida do quinto filho, casada com um homem que sofre de sífilis, cujo primeiro filho nasceu cego, o terceiro é surdo e o quarto também está com tuberculose, para abortar a criança que está em seu ventre? Se você disse sim, meus parábens: você acabou de matar Ludwig Van Beethoven.


O Aborto Tira a Possibilidade de uma VIDA !
Matando Beethoven

Um professor na Faculdade de Medicina da Universidade de Califórnia um dia perguntou aos seus alunos. "Aqui é a história da família. O pai tem sífilis. A mãe tem tuberculose. Eles já tiveram quatro filhos. O primeiro filho é cego. O segundo filho morreu. O terceiro filho é surdo e o quarto filho tem tuberculose. A mãe está grávida. Os pais estão dispostos a ter um aborto se for recomendado. O que é que vocês recomendam?"
A maioria dos alunos optaram pelo aborto. "Parabéns," anunciou o professor. "Você acabou de matar Beethoven."
Nada é tão final quanto à morte, mesmo quando é feito cedo na vida.


O Aborto TIRA A POSSIBILIDADE de uma VIDA Única,Singular...

Não sei realmente se o texto é verdadeiro,mas me parece que sim.
Senão for,me avisem.
Anônimo disse…
Nada se parece mais com um machista de direita do que um machista de esquerda...
José Elesbán disse…
Jean,
Belo desabafo.
Concordo contigo. Acho que aborto não deve ser usado como meio de controle da natalidade. E a princípio concordo que o aborto continue proibido para crianças feitas por meio de consenso entre duas pessoas. E os casos de estupro, risco de vida para a mãe, a legislação já contempla.
Me parece que a base dos teus valores é que quando a mulher se dá conta para pensar em aborto, a vida já está gerada dentro dela, e a tua base é a valorização da vida.
Abraço,
Zé Alfredo.
Roy Frenkiel disse…
Julia, infelizmente e com muita dor no peito, concordo contigo...
Anônimo disse…
Sou a favor da descriminalização do aborto.
pro RC.......
Só tens essa dor,só no peito,e nem no cérebro, que não foi abortado,graças a tua mãe, que acreditou que tu serias
uma coisa boa prá ela e pro mundão?
Não é ofensa,só quero entender certas idéias...

abçs
José Elesbán disse…
Caro Jean,
Este "post" tá dando assunto, hein?
Anônimo disse…
Vendo o assunto por uma outra perspectiva:

* Apoio médico e psicológico, ou cadeia?

(Tem até projeto de lei pra tornar o aborto em crime hediondo...)

Quem já soube de casos concretos de aborto deve ter uma visão mais realista sobre o assunto. (Também: o moralismo é com certeza um dos fatores que motivam abortos.)

Descriminalizar não é incentivar.

Selecionei algumas informações sobre esse assunto polêmico, ver:

sivuca.html#aborto
sivuca.html
Anônimo disse…
Gostei muito, Jean.
Abraço.