Pesadelo recorrente de inverno

O pesadelo é recorrente quando não interminável.

Um vizinho sacana, falso, hipócrita, metido, que roubou pra caramba do condomínio quando foi síndico, tem uma cadela que incomoda ainda mais que ele. Não vou dizer o nome do vizinho nem da cadela. Todo mundo no prédio sabe quem são. Digamos apenas vizinho X e cadela Y.

No pesadelo o vizinho X posta-se à noite no corredor e pôe-se a berrar os maiores absurdos e calúnias ininterruptamente, altos brados, enquanto a cadela Y late sem parar. Todos os moradores gritam que se calem, que saiam. Isto se estende até o amanhecer, quando então X sai e leva a cadela Y para a rua. Os dois vão pela Duque de Caxias até a Praça da Matriz. A cadela urina em todas as árvores da praça e as árvores secam imediatamente. X leva a cadela Y até a calçada em frente à Assembléia Legislativa. A cadela se coça e uma nuvem de pulgas invade a Assembléia. Depois disso X e Y param em frente ao Palácio Piratini. A cadela senta e ladra, ladra, ladra, ladra, sem parar mais. Do outro lado da praça, dentro do alto prédio, centenas de homens com vestidos pretos, vendados e segurando espadas e balanças, dançam e riem ao som produzido pela cadela Y e pelo seu dono, que mente e calunia o tempo todo, enquanto a cadela ladra, ladra, ladra...

(Chega de hibernar. Eu preciso acordar. É preciso levantar para acabar com esse pesadelo. E eu não consigo, sozinho eu não consigo.)